Pensamentos Desejosos do Mal
Pensamentos Desejosos do Mal: O que nos diz o Espiritismo?

O pensamento é a essência criadora da vida. É por meio dele que nos ligamos às forças do bem ou às do mal, que edificamos ou destruímos, que evoluímos ou permanecemos estagnados. A Doutrina Espírita, ao iluminar os recantos mais profundos da alma humana, convida-nos a refletir sobre o poder do pensamento e a responsabilidade que dele decorre.
Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, dedica especial atenção ao tema, propondo na pergunta nº 641 uma questão de natureza moral profunda: “Será tão repreensível, quanto fazer o mal, o desejá-lo?”. A resposta dos Espíritos Superiores é clara e de grande valor educativo: “Conforme. Há virtude em resistir-se voluntariamente ao mal que se deseja praticar, sobretudo quando há possibilidade de satisfazer-se a esse desejo. Se apenas não o pratica por falta de ocasião, é culpado quem o deseja.”
Essa lição transcende a moral aparente e nos transporta ao universo da intimidade espiritual, onde o pensamento se revela a fonte primária das ações. Desejar o mal, portanto, não é apenas um impulso interno sem consequência; é um ato vibracional que repercute no campo energético do próprio ser e do mundo que o cerca.
O Espírito Miramez, em sua obra Filosofia Espírita, através da mediunidade de João Nunes Maia, aprofunda este ensinamento, esclarecendo que “o homem erra pelo pensamento” e que “tudo de bom ou de mal nasce nos princípios do pensar, para então depois se materializar nos atos”. É uma afirmação que sintetiza a base moral da vida: antes de qualquer ação, existe a semente mental que a gera.
O Pensamento como Força Criadora
No contexto espírita, o pensamento não é uma simples abstração; é uma força viva, uma emanação do Espírito que cria, movimenta e sustenta realidades sutis. Cada pensamento, bom ou mau, se transforma em energia atuante, moldando a psicosfera individual e coletiva.
Miramez recorda que “pensamento é vida”, uma definição que encerra profunda sabedoria. Se o pensamento é vida, tudo aquilo que cultivamos mentalmente é algo que, de algum modo, existe e exerce influência — em nós e nos outros. Quando pensamos o mal, ainda que não o pratiquemos, damos-lhe forma energética, permitindo que ele se projete no mundo espiritual, onde encontra ressonância e continuidade.
Jesus já advertia quanto à responsabilidade do pensamento ao afirmar: “Qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura no coração, já adulterou com ela” (Mateus, 5:28). O Cristo nos ensinou que o mal não começa na ação, mas na intenção; que o pecado não se limita à exteriorização do ato, mas se inicia na vibração mental que o antecede.
Portanto, o desejo do mal é uma semente espiritual. Quando não combatido, germina e amadurece em atos, arrastando o ser para consequências que poderiam ter sido evitadas pela vigilância interior.
Desejar o Mal: A Raiz Invisível da Queda
Desejar o mal é consentir, ainda que em silêncio, com a sintonia das sombras. É abrir brechas no campo íntimo, permitindo que influências negativas encontrem terreno fértil. A resposta dos Espíritos a Kardec é profundamente educativa porque distingue entre duas situações morais: resistir voluntariamente ao mal desejado, o que é virtude, e não praticá-lo apenas por falta de oportunidade, o que é culpa.
Essa distinção revela a importância da intenção como critério da responsabilidade espiritual. Um indivíduo que domina seus impulsos e vence as tentações pelo esforço íntimo está se fortalecendo moralmente; já aquele que apenas se abstém por medo ou impossibilidade, mas continua nutrindo o desejo de prejudicar, permanece moralmente comprometido.
A evolução espiritual exige mais do que a aparência da virtude. Exige a purificação das intenções. Assim, o Espiritismo nos ensina que o verdadeiro bem nasce do coração e da mente em harmonia com as leis divinas.
Miramez adverte que o pensamento impuro “estraga a nossa conduta”, pois desequilibra as energias interiores e inspira outros a pensamentos semelhantes. Isso nos faz compreender que o mal desejado não é inócuo; ele se propaga, ainda que de forma invisível, influenciando outros seres, encarnados ou desencarnados, que vibram na mesma faixa mental.
A Doutrina Espírita como Escola da Mente
A Doutrina Espírita, ao revelar a natureza espiritual do pensamento, apresenta-se como uma verdadeira escola de educação mental. Educar o pensamento é educar o Espírito, pois o pensamento é o instrumento com que o Espírito atua sobre a vida.
Miramez define o Espiritismo como “uma escola de educação da nossa mente”, mostrando que o conhecimento espírita não se limita à teoria, mas visa à transformação íntima. O estudo, a prece, a vigilância e a prática do bem são exercícios que disciplinam o campo mental e libertam o ser das vibrações inferiores.
A mente é comparável a um canteiro: tudo o que se planta floresce. O cultivo constante de bons pensamentos gera serenidade, equilíbrio e sintonia com os planos superiores. Por outro lado, a permissão para que o ódio, a inveja e o rancor germinem em nossas ideias cria o terreno propício para o sofrimento moral e espiritual.
Assim, educar a mente é um dever permanente. É construir diariamente uma “planta mental”, como diz Miramez, onde o material é o pensamento puro e o arquiteto é o esforço moral.
A Influência do Pensamento nas Relações Espirituais
Um dos ensinamentos mais relevantes que decorrem desse tema é a compreensão de que nossos pensamentos não se limitam a nós mesmos. Eles alcançam outras mentes, tanto no plano físico quanto no espiritual.
O desejo do mal, mesmo não concretizado em atos, pode ser captado por Espíritos em sintonia com tais vibrações, tornando-se um convite à ação das forças inferiores. Assim, aquele que pensa o mal não apenas se compromete, mas pode inspirar outros a realizá-lo.
O pensamento é um fluido que se irradia e se associa a outros pensamentos afins. Quando uma pessoa cultiva a raiva, por exemplo, sintoniza-se com as mentes desencarnadas que se nutrem dessa energia. É dessa forma que se formam as obsessões, pois as afinidades vibratórias aproximam os semelhantes.
Daí a advertência de Miramez: “Esses pensamentos contrários ao amor podem inspirar outras pessoas, e a responsabilidade, em parte, cabe a quem formou as ideias negativas.” O Espiritismo amplia, assim, a noção de responsabilidade moral, mostrando que não somos responsáveis apenas por nossas ações, mas também pelas ondas mentais que emitimos.
O Exercício da Vigilância e da Prece
A vigilância é o primeiro antídoto contra o mal desejado. É o estado de consciência desperta que reconhece a origem dos próprios pensamentos e seleciona o que deve ser cultivado. Jesus recomendou: “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação.” A prece, aliada à vigilância, atua como força restauradora, reequilibrando o campo mental e fortalecendo a vontade.
No instante em que um pensamento malévolo surgir, a prece pode ser o escudo que impede sua expansão. Não se trata de reprimir com medo, mas de transformar a energia. O Espírito que ora verdadeiramente transmuta a vibração do desejo inferior em impulso de amor.
A vigilância, portanto, é disciplina moral; a prece é o alimento da alma. Ambas, combinadas, sustentam a renovação íntima que o Espiritismo propõe como caminho evolutivo.
A Pureza como Meta da Evolução
Miramez recorda a bem-aventurança de Jesus: “Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus.” A pureza, nesse contexto, não é a ausência de erros, mas a constante busca por pensamentos e sentimentos elevados.
O Espírito que se esforça por manter a mente pura alcança um estado de serenidade que o aproxima da presença divina. Ver a Deus, como ensina o Evangelho, é percebê-Lo na consciência tranquila, na paz que decorre da harmonia interior.
A pureza de pensamentos não é um ideal distante. É uma construção cotidiana, feita de pequenos esforços, de vitórias íntimas sobre o orgulho, o egoísmo e o ressentimento. Cada pensamento nobre é um degrau rumo à perfeição espiritual.
Semear Sombras
Desejar o mal é semear sombras em nosso próprio caminho. Mesmo que o ato não se concretize, o pensamento negativo permanece vivo, produzindo efeitos no mundo espiritual e no campo íntimo.
A Doutrina Espírita, pela sabedoria dos Espíritos Superiores e pela luz de ensinamentos como os de Miramez, convida-nos a compreender que o verdadeiro progresso começa no pensamento. Educar a mente é libertar-se das algemas do mal.
Quando o Espírito aprende a desejar o bem, mesmo em meio às provações, começa a trilhar o caminho da regeneração. E, na medida em que purifica seus pensamentos, aproxima-se da sintonia divina, tornando-se coautor da obra de Deus no mundo.
Pensar o bem é servir à luz. E quem serve à luz não apenas ilumina o próprio caminho, mas ajuda a dissipar as sombras do planeta, fazendo do pensamento um instrumento sagrado de amor, paz e evolução.